JANNAH LOONTJES (Copenhaga, 1974). Filha de um casal de
hippies que se mudou pouco tempo após o seu nascimento para a Suécia, dividiu
os anos de infância entre esse país e a Holanda, até se mudar definitivamente
com a mãe para a Holanda, onde estudou Filosofia da Arte na Universidade de
Amesterdão. Depois da licenciatura, estudou Filosofia em Nova Iorque, na New School for Social
Research. Em 2012 doutorou-se em Estudos Literários na universidade de
Amesterdão.
Poeta, prosaísta,
filósofa, docente de análise literária e de filosofia, Jannah Loontjes publicou
em 2002 o seu primeiro livro de poesia intitulado Varianten
van nu (Variações Actuais) . Em 2006
foi publicado o seu segundo livro, também de poesia, Het ongelooflijke krimpen (O encolhimento inacreditável). Estreou-se
como romancista em 2007 com o romance Veel geluk (Boa Sorte), a que se seguiu em 2011 o romance Hoe laat eigenlijk (Que
Horas São Estas?), muito bem acolhido pela crítica e nomeado para o Prémio
Literário Halewijn. O ano de 2013 foi
especialmente frutífero, tendo publicado um livro de poesia Dat ben jij toch (És tu porém) e um
conjunto de ensaios intitulado Mijn leven
is mooier dan literatuur (A Minha Vida é Mais Bonita do que a Literatura). Jannah
Loontjes escreve ainda críticas literárias para vários jornais e revistas de
referência, assim como ensaios sobre poesia e filosofia.
Embora o tom usado na
sua obra poética seja ligeiro e gracioso, os temas que aborda podem
envolver questões tão antigas como a Humanidade; questões existenciais que
todos nós alguma vez nos colocamos. Loontjes mostra interesse em
compreender o que sentimos, o que pensamos, como reagimos em grupo ou
individualmente, e, aquilo que nos torna únicos como seres humanos. Muitas
poesias incidem sobre a vivência do
indivíduo numa situação concreta, utilizando uma linguagem acessível, a que não
faltam os sons nem as cores. A sua
poesia é sobretudo uma expressão da sua admiração e curiosidade pelo que nos
rodeia.
Em mais uma excelente tradução de Maria Leonor Raven-Gomes, quatro poemas.
§
TAMBÉM
§
TAMBÉM
Mãos inexistentes segurando coisa nenhuma
zero graus talvez existam,
contudo. O leite também azeda
com a trovoada. Os vulcões têm nomes
permanentes, mesmo se não expelem lava.
O mesmo nome não promete que
sejamos semelhantes. Água e fantasmas
conseguem atravessar muitas coisas.
Consegues ver através de nada? Os fantasmas
vivem, sim e não. Ausente é quando estás
não estando. Às vezes sinto a tua ausência
mesmo estando tu presente. Às vezes estás
sem seres
aquele de quem sinto a falta.
Nem todas as nuvens têm um nome.
(de Dat ben jij toch, 2013)
(de Dat ben jij toch, 2013)
§
TRASEIRAS
Abro a porta, entro na varanda. Noite.
Nos quintais vestígios de pombos. Neve
que jaz ao acaso. Um gato sob um arbusto
sacode o pêlo, embosca uma sombra.
A lua descansa sobre um telhado. Cortada por vozes
que cantam.
Al Jazeera.
Roupa enregelada pendurada num silêncio de morte.
A camada branca ocupa tudo sem vergonha, faz amizade
com ombreiras pálidas, grades de varandas, antenas
parabólicas.
Também eu pertenço aqui. Sozinha. Porém,
rodeada de gente e animais.
Porém e porém. Isto é tão inverno, tão noite
como uma noite de inverno. Aspiro. Cheiro. Lixo.
Humidade. Cozinha. Pêlo de gato.
(de Dat ben jij toch, 2013)
(de Dat ben jij toch, 2013)
§
PANORAMA
A noite paira sobre a cidade
imóvel como numa fotografia,
um filtro de crepúsculo lilás
granula o panorama,
entranha-o como
folhas de chá
em água a ferver
e descolora a
vida
como algo
numa velha fotografia polaróide
que mais tarde
quando espero esquecer
me irá recordar
flâmulas de paixão
nas quais o teu nome ondula
como um cachecol perdido
em dias tímidos de inverno.
(de Varianten van nu, 2002)
(de Varianten van nu, 2002)
§
ENFADO
Como uma ligadura de gesso
o tempo enrolou-se à volta das
minhas pernas,
nada vejo à minha volta
ou parece que tudo desapareceu.
Amanhã e ontem colocam-me
as mesmas questões
hoje dobra-se entre
o papel empoeirado
de um pesado livro enfadonho
em cima da secretária,
aonde me sento
e sento.
(de Varianten van nu, 2002)
(de Varianten van nu, 2002)
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