K. SATCHIDANANDAN nasceu em Pullut (India) em 1946. É um dos mais importantes poetas indianos da actualidade. Escreveu mais de vinte colecções de poesia estando traduzido em mais de uma dezena de idiomas. Jorge Sousa Braga traduziu dois dos seus poemas, do inglês, que aqui se apresentam.
CACTOS
Os espinhos são a minha linguagem.
Anuncio a minha existência
com um toque de sangue.
Estes espinhos já foram flores.
Odeio os amantes que se traem.
Os poetas abandonaram os desertos
e regressaram aos jardins.
Só os camelos permanecem aqui e os comerciantes
que transformam as minhas flores em pó.
Um espinho por cada rara gota de água.
Não sou uma tentação para as borboletas.
Nenhum pássaro canta em meu louvor.
Não sou responsável por nenhuma seca.
Crio outra beleza,
para além do luar,
deste lado dos sonhos,
uma afiada e penetrante
linguagem paralela.
§
UM HOMEM E UMA PORTA
Um homem carrega uma porta
pela rua fora.
Procura a sua casa.
Ele sonhou
com a mulher, filhos e amigos,
a entrarem através daquela porta.
Agora vê o mundo todo,
a entrar através da porta
da sua casa ainda por construir:
homens, veículos, árvores,
animais, pássaros, tudo.
E a porta, o seu sonho
erguendo-se acima da terra,
anseia ser a porta dourada do paraíso.
Imagina nuvens, arco-íris,
demónios, fadas e santos
passando através dela.
Mas é o senhor do inferno
quem guarda a porta.
E agora deseja apenas ser uma árvore
cheia de folhas,
ondulando na brisa,
para providenciar alguma sombra,
ao seu carregador sem abrigo.
Um homem carrega uma porta
ao longo da rua.
Um homem e uma estrela.
1 comentário:
Que belo! Não conhecia este poeta, mas de certeza que me vou interessar na sua escrita a partir de hoje!
Muito obrigada por partilhar a pureza destes versos!
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