domingo, junho 12, 2011

LULJETA LLESHANAKU


LULJETA LLESHANAKU (ler Liublieta) nasceu em Elbasan, Albânia, em 1968. Cresceu sob prisão domiciliária durante a ditadura estalinista de Enver Hoxha, o que comprometeu o início dos seus estudos. Quando o regime caiu, em 1990, cursou Filologia Albanesa na Universidade de Tirana, tendo a seguir trabalhado como professora, editora e jornalista. A sua poesia destaca-se de entre a mais recente poesia albanesa pelas fortes imagens, humor e sensibilidade, e por uma particular enfâse na condição humana no leste europeu. Os três poemas que se seguem são versões que trouxe do inglês, retiradas do seu livro “Child of nature” (New Directions, New York, 2010), traduzidos do albanês por Henry Israeli e Shpresa Qatipi. Uma extraordinária descoberta, penso eu, uma excelente surpresa. Com a devida vénia:



Quando pela primeira vez olhei uma pintura verdadeira
dei alguns passos atrás instintivamente
sobre os calcanhares
procurando o local exacto de
onde pudesse explorar sua profundidade.

Foi diferente com as pessoas:
Construi-as,
amei-as, mas não cheguei a amá-las plenamente.
Nenhuma chegou tão alto quanto o tecto azul.
Como numa casa inacabada, parecia haver uma folha de plástico por cima delas,
por vez do telhado
no princípio do outono chuvoso da minha compreensão.



§



O MISTÉRIO DAS ORAÇÕES



Na minha família
as orações eram ditas em segredo,
suavemente, murmuradas sob cobertores por
narizes obstruídos,
um suspiro antes e um suspiro depois
finos e estéreis como um curativo.

No exterior da casa
havia apenas uma escada de madeira
para subir, encostada à parede durante todo o ano,
pronta a usar em Agosto para reparar as telhas antes das chuvas.
Nenhum anjo subiu
e nenhum anjo desceu –
somente homens sofrendo de ciática.

Oravam para obter um vislumbre Dele
na esperança de poder renegociar contratos
ou adiar prazos.

"Senhor, dai-me força", diziam eles
pois eram descendentes de Esaú
e tinham que se contentar com a bênção
deixada por Jacob,
a bênção da espada.

Em minha casa, rezar era considerado uma fraqueza
como fazer amor.
E tal como fazer amor
era seguido pela longa
noite fria do corpo.



§



PRISIONEIROS



Prisioneiros
culpados ou não
parecem sempre iguais quando são libertados –
patriarcas destronados.

Este acabou de passar cabisbaixo
pelo portão, apesar de não ser alto
seus gestos como os de um Beduíno
entrando na tenda
transportando às costas o dia inteiro.

Cortinas de algodão, paredes de pedra, o cheiro a cal queimada
levam-no de volta para o momento
em que a guerra fria terminou.

No outro dia, o seu lençol foi pendurado no pátio
como se a ostentar a mancha de sangue
depois da noite de núpcias.

Rostos manchados pelo sol
cercam-no, todos olhos e ouvidos:
"Com o que é que sonhaste a noite passada?"
Os sonhos de um prisioneiro
são pergaminhos
feitos sagrados pelas passagens em falta.

Sua irmã ainda está a descobrir os seus estranhos hábitos:
pedaços de pão escondidos nos bolsos, e sob a cama
o implacável corte da madeira para o inverno.

Porquê este medo?
O que pode ser pior do que a vida na prisão?

Ter escolhas
mas ser incapaz de escolher.



§



ELES APRESSAM-SE A MORRER



Eles estão a morrer um após o outro;
lançar terra sobre eles tornou-se tão comum
como aspergir sal na comida.

São todos eles da mesma geração, a minha família,
ou mais precisamente, da mesma época,
e os filhos de uma época são como cães amarrados a um trenó:
na sua busca pelo ouro
ou correm todos ou caem juntos.

Não é matemática,
é como um pente, um pente que domará um cabelo em rebelião
após um namorico louco, ante o espelho.

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