sexta-feira, março 02, 2007

HERMAN DE CONINCK

HERMAN DE CONINCK, poeta belga (Mechelen, 1944) foi traduzido em Outubro de 1994 nos seminários de tradução colectiva de Mateus. A Quetzal editou-o em 1996, num livrinho revisto, completado e apresentado pelo poeta Nuno Júdice, intitulado “Os Hectares da Memória”. Coninck, um dos mais importantes flamengos do pós-guerra, foi mais um desses poetas europeus – como Egito Gonçalves, – que tanto incomodaram os puristas por possuir uma notável capacidade de apreender de um quotidiano aparentemente estéril e banal, instantes sagazmente luminosos, através do uso de uma linguagem com notável capacidade discursiva, onde o humor não é o menor dos seus recursos. Foi um poeta do seu tempo: a fruição do leitor na leitura dos seus poemas resulta, suponho, da identificação com imagens suas contemporâneas que, com aparente objectividade, se dão a ler no poema. Herman de Coninck morreu subitamente numa rua de Lisboa, em 1997, a caminho de uma reunião de poetas. Eis três poemas, com a necessária vénia, para o dar a conhecer ou recordar.


RAPARIGA

Tu própria, que podes ter a noção e ao mesmo tempo
o atrevimento de simplesmente expor
de vez em quando uma opinião
ou um seio: quando começa isso,

e no fundo quando acaba? As mulheres
são feitas de raparigas, aos quarenta
ainda deitam a língua de fora como aos quinze,
ficam cada vez mais jovens,

não sabem não seduzir. Como a poesia:
um gato que prudentemente caminha sobre as teclas
de um piano e olha para trás:
ouviste? viste-me?

Ah, o ar jovem das raparigas de quarenta,
como umas vezes querem, e outras não,
mas afinal sempre, se repararmos bem.
Onde estão os bons velhos tempos? Estão aqui, esses tempos.





ELEFANTE

É feito dos efeitos mais grosseiros,
usa as calças como o palhaço pobre,
os joelhos a nadar; dá passinhos de dança
como um pastelão a martelar um tanga,
enquanto o olho do cu parece
uma dentadura

acabada de tirar. E depois a tromba
e mesmo ao lado os olhos. Como é que ficarias
se te pusessem a gaita no nariz?





Fotografias a cor de Patrick de Spiegelaere:
vistas do mar. Pergunto-lhe os seus truques.
Nenhuns, diz ele. Esperar até às dez da noite,
e então consegues uma luz assim.

Esperar até aos cinquenta.
E então consegues um poema assim.


3 comentários:

Alves Bento Belisário disse...

"A bátega em desmaio
Ao chão. Um bulir...
Antes poesia que poeta."

María José Cuesta disse...

Gostaria de saber as circunstancias que levaram a instalação da placa na calçada da rua Marquês Sá da Bandeira em Lisboa em memória do sr. de Coninck. É muito interessante.

Tamborim Zim disse...

Encantada e muito grata por este blog. Neste segmento gostei particularmente do poema Rapariga.