Setembro 13, Quinta-feira, Dia 3
9 h 25 m
Mais um dia, no bloco. Ontem, saímos às quatro e um pouco erraticamente aconteceu-nos ir descendo em direcção a Downtown, a mim e a Pablo B., o colega argentino.
Tenho resistido a ir ver os destroços. Parece-me algo de inútil. Mas acabámos por descer quarenta e cinco quarteirões, da 68 à 23. E foi nessa mesma rua que o acaso tomou a forma de um sinal.
Encontram-se muitas moedas pelo chão. Já recolhi sessenta e cinco. Mas aquela última moeda pareceu-me especial: era uma moeda polaca, da nacionalidade do Papa, uma ficha telefónica da Polska Telegraf Telefon.
Nos Estados Unidos da América, uma moeda polaca, usada para comunicar..., dei comigo a pedir a Pablo que procurássemos um templo. Um templo, qualquer que fosse. Mesmo até uma sinagoga.
Entrámos numa pequena igreja onde ficámos longamente. À saída, uma senhora quis saber as nacionalidades. Já tinha estado no Porto. Que aquele era um templo holandês.
Concordamos num sorriso que existe um só Deus. Ainda há dias nos lembraram que há quem não pense assim.
12 h 10 m
(Pausa para almoçar.)
Acumulam-se os relatos e as histórias mais incríveis. Como a do casal que saltou de mãos dadas, para o vazio.
O inferno deve ser isso: o mundo em redor a arder, uma hipótese de fuga, a procura desesperada de mais um minuto de vida.
Escolher o suicídio e saltar para o vazio. Qualquer coisa deve ser melhor que o inferno puro.
16 h 50 m
“You guys are experiencing History.”
Burton D. é ortopedista.
"Quando voltarem para casa contem tudo o que viram. Nunca mais se esqueçam disto. Eu quero que vocês os dois nunca mais se esqueçam disto…"
Pablo fixa Burton D., enquanto se serve de um cappuccino.
"O meu vizinho de cima ficou no 104º piso."
Nem eu nem o argentino sabemos o que dizer. Mas a América, como sempre, sabe encontrar o caminho:
"Hey, vocês sabiam que o meu cão foi operado ontem? Numa clínica na Quinta Avenida? Puseram-lhe um pace-maker, dei dois mil dólares por aquilo. Vocês acreditam nisto? É um golden retriever. Two fucking thousand dollars. Can you guys believe this?"
18 h 20 m
Enquanto em Downtown não se desiste de revolver o entulho, nos canais de televisão apela-se pelos desaparecidos. É descrita a profissão, a última roupa vestida, aquele acidente físico que leve à identificação.
Até o piso da empresa é o factor de prognóstico.
De Times Square a Downtown, em papel fotocopiado, são às centenas os posters que pedem o impossível.
Apenas mais um paradoxo neste drama sem sentido: a foto dos procurados é, desta vez, a das vítimas.
9 h 25 m
Mais um dia, no bloco. Ontem, saímos às quatro e um pouco erraticamente aconteceu-nos ir descendo em direcção a Downtown, a mim e a Pablo B., o colega argentino.
Tenho resistido a ir ver os destroços. Parece-me algo de inútil. Mas acabámos por descer quarenta e cinco quarteirões, da 68 à 23. E foi nessa mesma rua que o acaso tomou a forma de um sinal.
Encontram-se muitas moedas pelo chão. Já recolhi sessenta e cinco. Mas aquela última moeda pareceu-me especial: era uma moeda polaca, da nacionalidade do Papa, uma ficha telefónica da Polska Telegraf Telefon.
Nos Estados Unidos da América, uma moeda polaca, usada para comunicar..., dei comigo a pedir a Pablo que procurássemos um templo. Um templo, qualquer que fosse. Mesmo até uma sinagoga.
Entrámos numa pequena igreja onde ficámos longamente. À saída, uma senhora quis saber as nacionalidades. Já tinha estado no Porto. Que aquele era um templo holandês.
Concordamos num sorriso que existe um só Deus. Ainda há dias nos lembraram que há quem não pense assim.
12 h 10 m
(Pausa para almoçar.)
Acumulam-se os relatos e as histórias mais incríveis. Como a do casal que saltou de mãos dadas, para o vazio.
O inferno deve ser isso: o mundo em redor a arder, uma hipótese de fuga, a procura desesperada de mais um minuto de vida.
Escolher o suicídio e saltar para o vazio. Qualquer coisa deve ser melhor que o inferno puro.
16 h 50 m
“You guys are experiencing History.”
Burton D. é ortopedista.
"Quando voltarem para casa contem tudo o que viram. Nunca mais se esqueçam disto. Eu quero que vocês os dois nunca mais se esqueçam disto…"
Pablo fixa Burton D., enquanto se serve de um cappuccino.
"O meu vizinho de cima ficou no 104º piso."
Nem eu nem o argentino sabemos o que dizer. Mas a América, como sempre, sabe encontrar o caminho:
"Hey, vocês sabiam que o meu cão foi operado ontem? Numa clínica na Quinta Avenida? Puseram-lhe um pace-maker, dei dois mil dólares por aquilo. Vocês acreditam nisto? É um golden retriever. Two fucking thousand dollars. Can you guys believe this?"
18 h 20 m
Enquanto em Downtown não se desiste de revolver o entulho, nos canais de televisão apela-se pelos desaparecidos. É descrita a profissão, a última roupa vestida, aquele acidente físico que leve à identificação.
Até o piso da empresa é o factor de prognóstico.
De Times Square a Downtown, em papel fotocopiado, são às centenas os posters que pedem o impossível.
Apenas mais um paradoxo neste drama sem sentido: a foto dos procurados é, desta vez, a das vítimas.
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