domingo, abril 08, 2007

DAVID GONZÁLEZ

Um livro de leitura quase obrigatória para quem pretende acompanhar a contemporaneidade espanhola é “Poesia Espanhola, Anos 90”, com o qual Joaquim Manuel Magalhães prossegue a sua benvinda tarefa de mostrar e recensear o que de melhor se vai fazendo no país vizinho no que à poesia diz respeito. Tal é o caso – para dar dois exemplos – dos poemas “Fragmento Épico”, de Juan Antonio González Iglesias (Salamanca, 1964) ou “Retiro Sentimental”, de José Luis Piquero (Mieres, Astúrias, 1967). Dois poemas que valem o preço do livro. Ao todo são 90 poemas de 30 jovens poetas, desde Eduardo Moga (Barcelona, 1962) até Paulino Lorenzo (Logroño, 1975), autores de bons e (de uma mão cheia de) excelentes poemas, no que têm de surpresa, originalidade e consistência. Motivos de sobra para ler – e ter – o livro. A minha escolha - periférica, como sempre - vai com a devida vénia para “Os Pêsames”, de David González (San Andrés de los Tacones, Gijon, 1964), nas palavras de Joaquim Manuel Magalhães um “poeta de uma perturbante confessionalidade, enraizado na tragédia da vida que a alguns acontece ter de viver, não é a voz da literatura que meramente nos seus poemas fala, mas uma voz que viveu, por imposição legal, e, depois, por obrigação de sobrevivência quotidiana, universos concentracionários que criam palavras de uma sufocante autenticidade.


OS PÊSAMES

O Cejas embeiçou-se por mim
e quer foder-me o cu a todo o custo.
Mas sozinho não vai poder comigo.
Bem o sabe.
Então combina com o Tajas e o Bullati.
Em troca da sua ajuda dá-lhes
uma caixa de Roypnol a cada um.
O seu plano é este:
o Tajas e o Bullati levam-me
para a sala da televisão.
Ali dão-me uma sova que me deixa desfeito,
assim quando depois aparecer o Cejas
não estarei em condições de o pegar de caras
e poderá ir-me ao cu a seu inteiro prazer.
Contudo, o plano falha.
Na véspera à noite
morre
a mãe do Tajas e o Tajas,
acabrunhado, não quer levar por diante
o plano. O Bullati também não.

A pergunta é quase obrigatória:
tenho de dar os pêsames ao Tajas?



Entrevista em:

1 comentário:

Anónimo disse...

Realmente fabuloso, este trabalho de Joaquim Manuel Magalhães.

Um abraço